Eleitores, mercados e o novo círculo virtuoso na Argentina

Em 18 de maio, a população da Cidade de Buenos Aires foi às urnas para eleger os deputados estaduais. A chapa liderada por Manuel Adorni, atual porta-voz do governo do presidente Javier Milei, venceu com 30% dos votos, superando tanto os candidatos peronistas de esquerda quanto os da Propuesta Republicana (PRO), partido do prefeito da capital argentina. Antes da eleição, a maioria das pesquisas de opinião indicava que Adorni seria derrotado. No entanto, no dia seguinte ao pleito, mesmo em meio a um contexto de retração no mercado global, as ações e os títulos argentinos registraram forte valorização.

Mas por quê? Uma eleição local poderia ter um impacto nacional tão significativo? Tudo indica que os investidores celebraram a vitória de Adorni, interpretando-a como um sinal de que os candidatos de Milei poderão ter um bom desempenho nas eleições legislativas de meio de mandato, previstas para outubro. Considerando que seu partido, La Libertad Avanza, detém atualmente menos de 15% das cadeiras no Congresso argentino, os mercados preveem que Milei ampliará sua representatividade. Ele não precisa conquistar a maioria para se fortalecer: assegurar um terço do Senado seria suficiente para protegê-lo de um eventual processo de impeachment.

O impacto da eleição em Buenos Aires sobre os mercados foi modesto, especialmente quando comparado à vitória de Milei na eleição presidencial de 2023. Isso é natural: enquanto a vitória de 2023 sinalizou uma guinada na política econômica em direção à liberalização, a eleição de 2025 pode consolidar e fortalecer o atual governo de orientação libertária.

O cenário, contudo, já foi bem diferente na Argentina, e não faz tanto tempo. Em 2019, as eleições primárias deixaram claro que o então presidente Mauricio Macri — um líder de perfil pró-mercado, mas que fracassou na implementação de reformas estruturais — perderia para Alberto Fernández, candidato peronista de esquerda que, segundo analistas, comprometeria os avanços econômicos do governo anterior. No dia seguinte às primárias, o mercado acionário argentino despencou 48% — uma queda extraordinária, superada apenas pela observada no Sri Lanka durante sua guerra civil. O temor dos investidores era justificado: nos quatro anos seguintes, a Argentina entrou em recessão e mergulhou em um processo de hiperinflação.

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Em seu clássico livro “Ação Humana”, o economista austríaco Ludwig von Mises afirmou que, numa economia capitalista, as pessoas “votam” no supermercado, escolhendo determinados produtos em detrimento de outros. Os investidores se comportam de maneira análoga quando decidem confiar em um governo — comprando seus títulos públicos — ou apostar em empresas nacionais apenas se o ambiente de negócios for favorável.

Na Argentina, o otimismo em relação a Milei resultou numa expressiva valorização do mercado financeiro, que também fortaleceu o peso, reativou as operações de crédito imobiliário, dinamizou o mercado de imóveis e levou as vendas de automóveis a níveis históricos — efeitos concretos que beneficiam a população em geral. Essa dinâmica cria uma relação de reforço mútuo: eleitores animam investidores, e investidores reforçam a confiança dos eleitores.

O impacto das eleições sobre os mercados poderia ser ainda mais expressivo se mais argentinos investissem diretamente em ações. Atualmente, apenas 5% da população participa do mercado acionário, comparados a 55% dos norte-americanos, 33% dos britânicos e 13% dos espanhóis. Esse índice modesto está relacionado ao fato de que, segundo estimativas, os argentinos mantêm cerca de US$ 277 bilhões fora do sistema financeiro do país — uma consequência de décadas marcadas por políticas intervencionistas e elevada carga tributária. O governo Milei busca atrair investidores locais com medidas pró-mercado, mas ainda enfrenta desafios para conquistar sua confiança. O que poderia acontecer se mais argentinos passassem a investir?

Independentemente da origem dos investimentos, parece que, enquanto Javier Milei permanecer no poder, continuar perseguindo sua agenda libertária e for bem-sucedido na liberalização da economia, ele manterá o apoio dos investidores. Desde 2023, a Argentina ingressou em um círculo virtuoso: os eleitores escolhem políticas orientadas para a liberdade econômica; os investidores respondem positivamente, estimulando bons resultados; o otimismo se retroalimenta, e o governo Milei se beneficia politicamente, conseguindo avançar com reformas tipicamente impopulares, como o ajuste fiscal.

É claro que fatores internacionais podem ameaçar esse processo. A eventual escalada de uma guerra comercial liderada por Donald Trump, por exemplo, poderia empurrar o mundo para uma recessão, com consequências globais potencialmente devastadoras, afetando também a Argentina. Mas, ceteris paribus — expressão em latim que significa “mantidas as demais condições constantes” —, eleitores pró-mercado podem reforçar a confiança dos mercados, e o otimismo dos mercados pode, por sua vez, fortalecer a confiança dos eleitores.

Não é apenas o governo de Javier Milei, mas também os cidadãos que continuam a apoiá-lo, que estão pavimentando um novo caminho na Argentina — tanto nos mercados quanto nas urnas.

Marcos Falcone é mestre em Ciências Sociais pela Universidade de Chicago e bacharel em Ciência Política pela Universidade Torcuato Di Tella.

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©2025 FEE – Foundation for Economic Education. Publicado com permissão. Original em inglês: Voters, Markets, and the New Virtuous Circle in Argentina

noticia por : Gazeta do Povo

sexta-feira, 30, maio , 2025 12:44
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