O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) quer promover mudanças na carreira de pesquisadores que atuam em secretarias e autarquias de São Paulo. Entre elas está o fim de acréscimos na remuneração por tempo de trabalho. As medidas, no entanto, desagradam parte da categoria.
Estima-se que as mudanças impactariam cerca de 900 pesquisadores na ativa em 16 institutos, como o Butantan.
Inicialmente, as alterações foram apresentadas no projeto de lei complementar nº 9/2025, protocolado no fim de abril. O texto, que tramita em regime de urgência na Assembleia Legislativa de São Paulo, reestrutura uma lei de 1975.
A Associação de Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) lançou um abaixo-assinado contra o projeto que, até o fechamento desta reportagem, reunia 16,3 mil assinaturas.
A gestão Tarcísio diz que já formulou um substitutivo, que pretende apresentar à Assembleia se receber aprovação da comunidade científica.
Na primeira versão, o projeto prevê o fim do regime de tempo integral. Os pesquisadores passariam a trabalhar 40 horas por semana, conforme a lei estadual nº 10.261/1968, que institui o regime jurídico dos funcionários públicos civis de São Paulo. O substitutivo mantém essa troca e acrescenta que haverá um regime de dedicação exclusiva, a ser definido por decreto.
Mas a APqC também se opõe ao substitutivo, posição referendada em reunião com os associados, segundo nota publicada na última terça-feira (10) pela associação. A entidade pede a retirada do projeto.
A presidente da APqC, Helena Dutra, diz que a minuta “é a mesma proposta e uma nova redação” e “tem os mesmos vícios e problemas”. Ela acrescenta que a categoria não participou das discussões que levaram tanto ao projeto original quanto ao substitutivo e que os pesquisadores buscam valorização salarial, não mudanças na carreira.
Em nota enviada à reportagem, o governo Tarcísio afirma que o projeto de lei complementar foi feito em conjunto “por um grupo técnico intersecretarial, a partir de um diálogo aberto, inclusivo e construtivo com a classe de pesquisadores”.
“Resultado disso é o fato de que uma parcela significativa desses profissionais, em especial aqueles que estão em início e meio de carreira, vem expressando apoio formal à proposta negociada”, diz o governo, citando um abaixo-assinado apoiado, até a manhã deste domingo (14) por 147 pessoas.
Ainda de acordo com o governo, após a apresentação do projeto, houve reuniões e debates com pesquisadores. Esse processo, diz o governo, resultou na formulação de um substitutivo “com avanços importantes trazidos pelos próprios pesquisadores”.
Entre eles, a administração estadual cita a reestruturação da carreira sem a revogação da lei de 1975; a implementação do regime de dedicação exclusiva, com controle de jornada; garantia da realização anual de concurso para promoção de nível e categoria e aumento de 20% para 70% do percentual de promovidos a cada concurso.
Remuneração
Permaneceu sem alteração entre as duas versões a remuneração por subsídio. A presidente da APqC argumenta que esse regime resulta em um reajuste baixo para a maioria dos pesquisadores. Na proposta, os pesquisadores começam recebendo R$ 9.05,47 e podem chegar a R$ 22.677,11.
Hoje, a remuneração dos pesquisadores de nível 1 é R$ 5.037,04, enquanto a base para o nível 6 é de R$ 11.939,67. Em cima desse valor, o pesquisador recebe gratificações, como adicional por tempo de serviço.
Sem esses acréscimos, não haverá reajuste significativo para quem já está há mais tempo, segundo a associação. De acordo com a APqC, 16% entre ativos e aposentados não terão reajuste com a proposta; para 19%, o aumento será menor que 5%, enquanto 13% terão reajuste acima de 50%.
A gestão Tarcísio diz que o modelo proposto amplia a estabilidade e a previsibilidade da remuneração e facilita negociações por reajustes salariais.
Na nota enviada à Folha, menciona ainda que a proposta “garante reajustes para 82,4% do total de 901 pesquisadores, sendo que, destes, 41,5% terão 49% de aumento”.
“Ressalta-se que, da porcentagem restante, muitos já recebem o teto do funcionalismo público”, afirma o governo.
Helena Dutra diz que a criação das categorias A, B, C para subir de nível é “desanimador” e deixa os aposentados em posição de incerteza. “Não há nenhuma garantia de que vão ficar na progressão mais alta do nível em que se aposentaram.”
A pesquisadora Patrícia Bianca Clissa, do Instituto Butantan, afirma que os profissionais que chegam por meio de um concorrido processo seletivo muitas vezes já têm até pós-doutorado vão levar ainda mais tempo para atingir o topo da carreira.
A APqC calcula que o tempo mínimo necessário para atingir o topo da carreira vai aumentar de 16 para 24 anos.
O que pode mudar com o substitutivo
Regime de remuneração
Como é: a remuneração tem um valor base mais acréscimos, como tempo de serviço.
Como ficaria: pesquisador recebe em regime de subsídio, o que retira remuneração variável e acréscimos por tempo de serviço.
Carga horária
Como é: trabalho em regime de tempo integral, o que impede contratação em outros empregos.
Como ficaria: regime de 40 horas semanais, em regime de dedicação exclusiva, que será regulamentado por decreto.
Progressão na carreira
Como é: há seis níveis de ascensão na carreira.
Como ficaria: dentro de cada um dos seis níveis, há três categorias (A, B, C) em que os pesquisadores precisam avançar para subir de nível.
Comissão regulamentadora
Como é: a Comissão Permanente do Regime de Tempo Integral (CPRTI) é composta de 13 membros escolhidos pelo governo, um de sua livre escolha e o restante a partir de uma lista de 24 nomes.
Como ficaria: troca a comissão anterior pela Comissão Permanente de Avaliação de Desempenho e Desenvolvimento, com 15 membros, dois de livre escolha do governador e 13 selecionados a partir de uma lista de 24 nomes.
noticia por : UOL